O que fazer para desacelerar nas férias?

Em tempos de excesso de telas, notificações e estímulos imediatos, as férias se apresentam como uma oportunidade rara: desacelerar. Afastar-se, ainda que temporariamente, do consumo constante de conteúdos digitais abre espaço para algo que nunca saiu de moda e nunca perdeu valor, o encontro com os livros, os jogos e o tempo de qualidade.

Desconectar não é negar a tecnologia, mas recolocar o essencial no centro. Ler um livro físico, jogar em volta da mesa, esperar a vez, lidar com o erro e sustentar a atenção são experiências formadoras que não competem com as telas: elas equilibram. São práticas antigas, sim, e justamente por isso profundamente humanas.

É nesse ritmo mais calmo, longe da lógica da pressa e do entretenimento automático, que o aprendizado ganha profundidade. As férias, quando bem vividas, não interrompem a formação: elas a fortalecem. Formam leitores, pensadores e sujeitos capazes de olhar o mundo com mais curiosidade, senso crítico e sensibilidade.

Ler e brincar são práticas antigas e exatamente por isso tão valiosas. Um bom livro acompanha fases, provoca perguntas, consola, cutuca e amplia o mundo. Um bom jogo ensina a esperar a vez, a pensar antes de agir, a lidar com erros e a persistir. Juntos, eles formam leitores atentos, pensadores curiosos e sujeitos mais conscientes de si e do outro.

Sugestões de leituras para as férias

Dos primeiros contatos com a literatura às leituras mais densas da juventude, cada livro tem seu tempo. Respeitar esse percurso é fundamental para criar vínculo real com a leitura.

Entre 6 e 7 anos, A Parte que Falta, de Shel Silverstein, apresenta uma narrativa simples e sensível sobre buscas e descobertas daquelas histórias que crescem junto com quem lê.

Dos 8 aos 9 anos, Marcelo, Marmelo, Martelo, de Ruth Rocha, convida a criança a questionar o mundo e as palavras com humor e inteligência, enquanto O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, apresenta reflexões delicadas sobre amizade, amor e responsabilidade um livro para agora e para depois.

Na faixa dos 10 aos 11 anosDiário de um Banana, de Jeff Kinney, oferece identificação imediata e leitura fluida, enquanto As Crônicas de Nárnia – O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa, de C.S. Lewis, introduz uma fantasia clássica que fala de coragem, lealdade e amadurecimento.

Entre 12 e 13 anos, Extraordinário, de R.J. Palacio, trabalha empatia e convivência de forma profunda e acessível. Já Percy Jackson e o Ladrão de Raios, de Rick Riordan, mistura mitologia, humor e aventura, ampliando repertório cultural com ritmo envolvente.

Dos 14 aos 15 anos, entram em cena conflitos sociais e políticos. A Revolução dos Bichos, de George Orwell, provoca reflexões diretas sobre poder e manipulação, enquanto Capitães da Areia, de Jorge Amado, apresenta um retrato intenso da infância marginalizada e da amizade.

Entre 16 e 17 anos, 1984, de Orwell, segue extremamente atual ao discutir vigilância e liberdade, e Vidas Secas, de Graciliano Ramos, oferece uma leitura dura e necessária sobre desigualdade e resistência.

Já dos 18 aos 20 anos, Ensaio sobre a Cegueira, de José Saramago, questiona a ética e o comportamento coletivo de forma provocadora, enquanto O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger, segue dialogando com jovens adultos em transição, geração após geração.

O convite é criar vínculo: ler por prazer, por curiosidade, por incômodo. Ler junto, conversar, discordar dos personagens. É assim, do jeito mais tradicional e humano possível, que se formam leitores.

Aprender brincando: jogos que desenvolvem habilidades para a vida

Brincar nunca foi perda de tempo. Jogos bem escolhidos estimulam o raciocínio lógico, a concentração, a memória, a criatividade e habilidades socioemocionais essenciais. Ao lidar com regras, desafios e estratégias, aprendemos a pensar antes de agir, a persistir e a respeitar limites.

Jogos educativos favorecem um aprendizado ativo. O aluno deixa de ser espectador e se torna protagonista, testando hipóteses, tomando decisões e aprendendo com as próprias escolhas.

Entre os jogos indicados, Dobble e Taco, Gato, Cabra, Queijo, Pizza trabalham o controle inibitório de forma rápida e divertida, ideais para crianças a partir dos 6 anos. Jungle Speed também estimula essa habilidade, exigindo atenção e reação rápida.

Para desenvolver a memória de trabalho, jogos como Fantasma Blitz, Timeline: Invenções e Hora do Rush desafiam o jogador a organizar informações, planejar ações e resolver problemas de forma estratégica.

Story Cubes estimula a flexibilidade cognitiva e a criatividade, convidando os participantes a criar histórias a partir de dados ilustrados, ampliando linguagem, imaginação e expressão oral.

Filmes: diversão que também faz pensar

Férias escolares pedem descanso, boas histórias e momentos em família. E o cinema é um aliado clássico: diverte, emociona e ainda provoca reflexões importantes, para crianças, jovens e adultos. Pensando nisso, separamos algumas sugestões de filmes atemporais que são ótimas companhias para os dias de recesso.

O Show de Truman: O Show da Vida (1998)

Truman Burbank (Jim Carrey) leva uma vida simples e previsível, até começar a perceber que algo não encaixa. Aos poucos, ele descobre que sua rotina inteira é, na verdade, um programa de televisão transmitido 24 horas por dia. Um filme instigante, que provoca reflexões sobre liberdade, mídia, escolhas e identidade, excelente para assistir em família e conversar depois.

Up – Altas Aventuras! (2009)

Muito além de uma animação “fofa”, Up é uma história sensível sobre amizade, perdas, sonhos e recomeços. Com humor, emoção e personagens inesquecíveis (sim, inclusive cachorros falantes), o filme mostra que nunca é tarde para viver novas aventuras. Encanta crianças e toca fundo os adultos, daqueles filmes que ficam na memória.

Meu Amigo Totoro

Clássico absoluto do Studio Ghibli, Meu Amigo Totoro é uma obra delicada e poética de Hayao Miyazaki. A história acompanha duas irmãs que descobrem criaturas mágicas ligadas à natureza, visíveis apenas aos olhos das crianças. Doce, sensível e cheio de significado, é um convite à imaginação, ao afeto e à contemplação daqueles filmes que aquecem o coração e silenciam a correria do dia a dia.

Como Treinar o Seu Dragão (2025)

Live-action da franquia de sucesso da DreamWorks, o filme traz Mason Thames (O Telefone Preto) no papel de Soluço, um garoto que vive na ilha de Berk, onde vikings e dragões estão em constante conflito. Apesar de ser filho do chefe da ilha, Soluço não se encaixa no padrão guerreiro esperado, mas está disposto a provar seu valor. Tudo muda quando ele conhece Banguela, um dragão raro e perigoso, com quem cria um forte laço de amizade. Fiel à essência da animação original, o longa é dirigido por Dean DeBlois e recebeu boa recepção da crítica. Disponível no Amazon Prime Video.

Guerreiras do K-pop (2025)

Encerrando a lista com uma das produções mais populares de 2025, e a mais assistida da história da Netflix, Guerreiras do K-pop é uma animação dirigida por Maggie Kang. A trama acompanha Rumi, Mira e Zoey, integrantes do grupo de K-pop HUNTR/X, que escondem um segredo: além de artistas, elas são caçadoras de demônios e usam a música para proteger o mundo. Quando um grupo rival formado por demônios começa a ganhar popularidade, as três precisam enfrentar novos desafios. Com excelente recepção da crítica, o filme mistura ação, cultura pop, amizade e coragem de forma envolvente.

Arte também educa: férias como tempo de criação

Se ler, brincar e assistir bons filmes formam leitores e pensadores, criar com as próprias mãos forma o olhar, a sensibilidade e a autonomia. As férias, longe da pressa escolar, são um terreno fértil para experimentar linguagens artísticas com tempo, cuidado e curiosidade como sempre foi feito antes da lógica do imediatismo.

É nesse espírito que iniciativas culturais da cidade ganham ainda mais sentido. Em janeiro, a Casa Porto das Artes Plásticas abre inscrições para sua tradicional Colônia de Férias, uma programação gratuita que transforma o recesso escolar em um verdadeiro laboratório de criação artística. Em meio ao sol, às cores e à atmosfera do Centro Histórico de Vitória, crianças, jovens e adultos são convidados a desacelerar e criar.

Inspiradas no tema Carnaval 2026, as oficinas percorrem diferentes linguagens das artes visuais, pintura a óleo, ilustração, aquarela criativa e moda, respeitando o tempo de cada participante e valorizando o processo tanto quanto o resultado. São encontros que estimulam o olhar atento, a coordenação, a paciência e a expressão pessoal, habilidades que não se aprendem em tutoriais rápidos, mas na prática, na tentativa, no erro e na persistência.

Com turmas reduzidas, as oficinas acontecem ao longo de janeiro e na primeira semana de fevereiro, garantindo uma experiência próxima, acolhedora e cuidadosa.

Mais do que ocupar o tempo livre, propostas como essa criam memória afetiva, repertório cultural e vínculo com a cidade. São experiências que ensinam, de maneira silenciosa e profunda, que aprender também passa pelo corpo, pela observação e pela criação.

Assim como os livros, os jogos e os bons filmes, a arte feita com tempo cumpre um papel essencial: formar sujeitos sensíveis, atentos e capazes de olhar o mundo com mais cuidado. Porque, no fim das contas, tradição não é repetir o passado, é preservar o que sempre funcionou para formar gente inteira.