Publicado em 05/08/2019
No final de 2017, inspirada por visitas a escolas públicas que realizou na Finlândia, Ana Rita Costa Gomes, sócia-fundadora da Monteiro, elaborou o Projeto Bem-Estar. O Projeto consiste em uma iniciativa de caráter psicossocial e tem como intuito viabilizar e intensificar práticas educativas democráticas e emancipatórias por meio da expansão do diálogo. Ele abrange alunos, professores e demais funcionários e, por meio do estabelecimento de redes de cuidado e de atenção à vida, o Bem-Estar busca reforçar a visão de que discentes e docentes possuem um papel ativo no ambiente escolar, podendo contribuir juntos na construção do mesmo.
Assim, Ana Rita e Eduardo Gomes convidaram a psicóloga Carolina Rachel Mascarenhas, a auxiliar de coordenação do Fundamental I e assistente social, Gabriela Romanha, o psicólogo Fernando Schubert e a diretora pedagógica da Monteiro, Penha Tótola, para fazerem parte da equipe.
Na prática, em maio de 2018, ocorreu a implementação de assembleias escolares como primeira e principal iniciativa desempenhada pelo Projeto. Assumindo o formato de rodas de conversa, as assembleias são realizadas em cada turma. Elas compõem um espaço de liberdade de expressão no qual os alunos podem apresentar suas reflexões e propor mudanças sobre suas relações interpessoais, o funcionamento da instituição de ensino e práticas escolares que perpassam seu cotidiano. Usufruem da oportunidade de trabalhar situações de conflito em grupo.
Além das assembleias, o Projeto faz intervenções que ocorrem como rodas de conversa, oficinas, entre outros formatos. São pensadas pela equipe do Bem-Estar a partir de situações mais complexas e podem se desenrolar tanto como ações mais pontuais quanto contínuas. Tais intervenções também podem ser sugeridas pela coordenação a partir de observações feitas sobre os alunos ou levantadas por familiares que fazem contato com esse núcleo para abordar algumas questões.
Carolina, Gabriela e Fernando atuam nas atividades cotidianas do Bem-Estar. Gabriela é responsável pelo Fundamental I, Carolina pelo Fundamental II e Fernando pelos alunos do Ensino Médio e funcionários. Ajudam, ainda, na orientação e formação dos professores para que estes possam, futuramente, conduzir as conversas nas turmas sem a intervenção de pessoas externas às situações colocadas em pauta.
Ana Rita e Penha, por sua vez, atuam na parte de gestão, sendo responsáveis por pensarem as ações do Bem-Estar e fazerem a análise geral do andamento do Projeto.
Saúde e bem-estar – Concepções do Projeto
De acordo com a psicóloga Carolina Mascarenhas, a equipe do Projeto entende por “saúde” e “bem-estar” algo diferente das sensações constantes de alegria e felicidade – concepções bastante difundidas pela cultura da mídia. O Projeto abraça como referência o pensamento desenvolvido pelo filósofo e médico francês Georges Canguilhem, que, em suas obras, apresenta a saúde como a capacidade de lidar com as intercorrências do meio, ou seja, a capacidade de lidar com problemas e desafios.
Carolina acrescenta que o Bem-Estar compreende a saúde como um todo e que considera os indivíduos em sua forma integral sem fazer distinção ou separação entre a saúde física, mental e emocional. Assim, o Projeto parte do princípio de que o bem-estar e a saúde não podem ser considerados como um estado permanente e estável do ser humano, pois, de acordo com Carolina, “A vida não é estável. Ela é transformação, invenção, instabilidade. Então, o sofrimento, o adoecimento e os conflitos fazem parte do processo”.
Deste modo, alunos e colaboradores da Monteiro têm a oportunidade de desenvolver reflexões a respeito de suas posições no mundo, tanto pelo exercício do olhar para o outro quanto por meio do olhar interno.
A importância do Projeto Bem-Estar
Carolina argumenta que desenvolver este tipo de projeto no meio escolar é fundamental, pois é um ambiente de formação de pessoas. As assembleias dão continuidade a vários debates e atividades que visam à construção da grupalidade, melhoram a comunicação, proporcionam mais condições para enfrentar conflitos e divergências e promovem o aprendizado para lidar com diferentes opiniões e pensamentos.
Além disso, as assembleias promovidas pelo Bem-Estar ajudam os participantes a expressarem o que estão sentindo, auxiliando no desenvolvimento emocional e na melhora das relações sociais e subjetivas. Elas compõem um contexto de trabalho da fala e, principalmente, de escuta. Encontros coletivos como esses descentralizam o lugar de liderança e horizontalizam as relações, ofertando um espaço onde todos podem falar e ser ouvidos. “O Projeto vem estimulando a integração em grupo e contribui para a sensação de pertencimento”, reitera Carolina.
A psicóloga do Projeto ainda destaca um dos principais objetivos propostos: o incentivo à autonomia. O Bem-Estar faz os grupos saírem do lugar de tutela e de dependência para a resolução de conflitos, pois “Os envolvidos acabam se organizando e se responsabilizando por aquilo que é colocado em discussão nas assembleias. E o desenvolvimento da autonomia é muito importante no processo de aprendizagem, principalmente para a vida adulta, pois vivemos em uma sociedade que tira muito isso de nós”, pondera Carolina.
Resultados obtidos
Os resultados, em geral, foram bastante positivos. De acordo com o levantamento anual a respeito do Bem-Estar, a equipe observou que a maior parte das turmas demonstrou melhoras no desenvolvimento de competências socioemocionais.
Também foi possível constatar que os objetivos que visavam aprimorar os graus de autonomia, protagonismo e corresponsabilização dos estudantes e colaboradores vêm sendo alcançados, já que os próprios alunos de algumas turmas se organizaram para condução das assembleias, realizando inscrições e votações para representantes.
Bem-Estar – expectativas
O Projeto, que ainda está em processo de organização dentro da Monteiro, pode ser ampliado, de acordo com o que dizem os dois psicólogos da equipe. “Os resultados têm sido tão positivos que seria importante ampliá-los para os pais dos alunos e para a comunidade do entorno da Escola, pois a educação não se dá apenas na sala de aula, mas no meio em que se vive”, conta Fernando, reforçando a importância de também se pensar ações educativas na cidade.
Talita Vieira.