Gato de botas

Imagem – DreamWorks

O Gato de Botas está de volta em uma jornada mágica e cheia de aventuras, que vai além do mero entretenimento e se transforma em uma jornada pessoal de desenvolvimento, superação de medos e reflexão sobre o valor da vida.

Mas o que é a vida, senão o intervalo de tempo que temos entre o nascimento e a morte? Será que existe uma maneira correta de viver? Qual é o sentido da vida? O filme “Gato de Botas: O Último Desejo” mistura elementos de humor, aventura e fantasia, mas não busca respostas definitivas para essas perguntas. Cada pessoa tem sua própria visão de mundo, e é isso que torna a vida tão rica e diversa.

O que o filme faz, no entanto, é nos convidar a refletir sobre o valor da vida que estamos vivendo e a encontrar nossas próprias respostas. Dirigido por Joel Crawford e produzido pelo estúdio de animação DreamWorks, “O Gato de Botas 2: O Último Desejo” estreou nos cinemas brasileiros em janeiro de 2023.

Na trama, o corajoso Gato de Botas percebe que sua paixão por aventuras teve um preço alto: ele já perdeu oito de suas nove vidas. Determinado a mudar sua situação, ele embarca em uma jornada épica, repleta de releituras de contos de fadas, em busca do lendário “Último Desejo” que lhe permitirá recuperar todas as suas vidas.

Com uma história simples, mas criativamente construída, o filme traz elementos místicos, humor e encanto para ressuscitar os contos de fadas e proporcionar ao público uma experiência emocionante e reflexiva.

Charles Perrault

A MAGIA DA ADAPTAÇÃO LITERÁRIA

Antes de estrear no cinema, a história do bravo Gato de Botas surgiu na imaginação de um autor de contos e fábulas. Como em diversas outras incríveis histórias, o nosso herói felpudo é fruto de uma adaptação literária.

Dessa forma, o conto do Gato de Botas foi publicado, originalmente, no século XVII, em 1697, como parte de um livro chamado “Contos dos tempos antigos”, escrito pelo autor e poeta francês, Charles Perrault. Na fábula, é narrada a história de um gato esperto que ajuda seu dono a ter sucesso na vida.

Porém, se tratando de “Gato de Botas 2”, o longa-metragem introduz a figura do protagonista como alguém que além de ser muito sagaz, é imparável. A construção da figura do protagonista é conduzida para que seja transmitida a ideia de alguém sagaz, intocável, que ri na cara do medo e do perigo. Em poucas palavras: uma lenda.

É assim que enxergamos o Gato de Botas e – para além disso -, é assim que ele se enxerga. No entanto, essa auto imagem permanece íntegra por pouco tempo, pelo menos até que, em um dia, ele se depara com a ideia de que viveu imprudentemente todas as suas oito vidas e agora só resta uma. E para consolidar o fato de que ele não possui mais tempo para viver de forma imprudente, há o surgimento de um novo personagem, o Lobo, dublado pelo ator brasileiro Wagner Moura.

A antagônica presença do Lobo – que é a personificação da morte -, surge como o conflito do filme, o elemento propulsor que fará o herói refletir suas ações e colocá-lo em risco pela primeira vez. Uma vez que o ameaçador Lobo desconstrói absolutamente tudo que o Gato de Botas acreditou ser até então.

É graças à figura do Lobo que presenciamos, pela primeira vez, o Gato de Botas ser levado ao limite, sair finalmente da zona de conforto.

Em poucos minutos, ele deixa de ser destemido, para alguém que desesperadamente se treme de medo na presença do imponente inimigo. Deixa de ser imparável, pois agora encontrou uma figura tão ameaçadora que o trava de medo. Por fim, diante do temor de estar pela primeira vez de cara com algo que o ameaça de verdade, o Gato de Botas foge.

Este fato faz com que ele inicie uma série de questionamentos sobre a mortalidade e também sobre a maneira na qual viveu até o momento, além de abordar questões como ansiedade, amizade, companheirismo, confiança e superação do medo.

Mais do que isso, o filme promove uma reflexão muito intensa acerca da autoimagem e desenvolvimento pessoal, ao permitir que o telespectador acompanhe a jornada do protagonista de maneira próxima do telespectador, por meio de temas universais como o “medo”.

A ANATOMIA DO MEDO

De acordo com a psicóloga e psicanalista Fabiana Monnerat, o medo, a ansiedade e outros afetos são partes integrantes da experiência psíquica de todos os seres humanos. Esses sentimentos têm papel fundamental na nossa constituição individual, uma vez que não nascemos prontos, mas sim nos tornamos sujeitos à medida que crescemos e construímos nossa subjetividade por meio das interações com os outros. Sendo assim, na família, recebemos não apenas alimento, mas também linguagem, elementos essenciais para nossa formação.

Já na escola, se constitui o espaço das possibilidades de construção e ampliação dos vínculos. Esse espaço se torna rico para podermos pensar sobre o lugar de cada um, individualmente e dentro do convívio com outros.

QUEBRA DE CRENÇAS E EVOLUÇÃO PESSOAL

De acordo com Fabiana Monnerat, nossas crenças desempenham um papel crucial na organização de ilusões, o que é significativo. No entanto, é importante que essas crenças não obscureçam outras questões importantes sobre nós mesmos. Muitas vezes, essas crenças são baseadas no desejo de reconhecimento dos outros, levando a um profundo desconhecimento de nossos próprios desejos. Assim como o Gato de Botas, que buscava aventuras e o papel de herói, muitas vezes podemos nos perder em busca de espetáculos externos, sem questionar nossos próprios sentimentos e laços afetivos.

Fabiana Monnerat

“O Gato de Botas estava ancorado em uma crença de que era único, especial, herói e isto não foi suficiente para o ampará-lo frente ao risco de sua morte. A crença de que era o herói único foi abalada pelo fato de que frente à morte, ele era como todos os outros, sujeitos a afetos como medo e ansiedade”, explica a psicóloga.

“Ao escolher lidar com os próprios sentimentos ao morrer como herói, sustentando uma idealização de si. Ele então pode se encontrar com as verdades dos próprios sentimentos ‘esquecidos’ na sua história pregressa a partir dos laços com os outros e olhar de frente o medo. Foi desta forma que conseguiu superá-lo”, conclui, evidenciando a importância de se contestar crenças tidas como dogmas para permitir a evolução pessoal.

Kelly Carrareto – Professora do 5° ano

Ademais, o medo pode ser um impulso para a busca de proteção e segurança, levando o indivíduo a se adaptar e se integrar na sociedade em que vive. No entanto, o medo também pode ser limitante, gerando ansiedade e inibindo a expressão plena do indivíduo. Portanto, o medo desempenha um papel complexo e multifacetado na construção social de um indivíduo, afetando sua percepção, comportamento e integração na sociedade.

É muito importante incluir atividades culturais diversas na rotina dos alunos, dentro e fora da sala de aula.” argumenta a professora regente do 5º ano A, Kelly Conceição Silva Carrareto, sobre a importância de se apresentar diferentes tipos de atividades culturais para as crianças. “Teatro, exposições de arte, cinema. Nesses momentos trabalhamos a escuta, a atenção, o respeito ao outro”. Concluiu a professora.

Os estudantes dos 5º anos da Escola Monteiro foram ao cine Jardins assistir o filme Gato de Botas: O Último Desejo. Com isso, a professora Kelly fez uma Assembleia com os alunos a fim de escutar suas considerações acerca do filme, levando em consideração o que sentiram em torno de cada tópico abordado no filme.

CRESCER E AMADURECER

Os filmes e o audiovisual têm uma importância significativa na infância como material pedagógico. Eles oferecem às crianças uma oportunidade única de aprendizado, entretenimento e desenvolvimento de habilidades cognitivas e emocionais.

“Considerei a partir da minha dissertação de mestrado que os filmes, as histórias, os poemas e os contos são importantes, pois nos conectam com o passado, com as pessoas e as nossas relações afetivas ao longo da vida”, argumenta.

Segundo a psicóloga e psicanalista, os filmes e os programas de TV podem ser usados como ferramentas educacionais para ensinar conceitos complexos de forma acessível e cativante, despertando a curiosidade e o interesse das crianças.

“Como diz a escritora colombiana, Yolanda Reyes, somos todos parte de uma ‘saga escrita com palavras’. É a partir delas que as crianças podem dar nomes às suas sombras e a tantas coisas difíceis. Elas precisam encontrar espaços dispostos a escutá-las”, conclui.

Além disso, o audiovisual permite que as crianças explorem diferentes culturas, perspectivas e realidades, expandindo seu horizonte e estimulando a empatia. Por meio do uso adequado e supervisionado do material audiovisual, as crianças podem desenvolver habilidades de observação, análise crítica, pensamento criativo e resolução de problemas.

No caso do filme citado, além de um espetáculo visual, o que o telespectador recebe é uma imersão completa dos assuntos abordados no longa-metragem, ou seja: é mais do que entretenimento, se trata de uma obra completa capaz de promover reflexões acerca de assuntos diversos e, ainda assim, íntimos de cada um, como a reflexão da vida, o que realmente importa, uma jornada de amadurecimento e evolução pessoal.

No filme “O Gato de Botas 2”, o protagonista passa por uma jornada de evolução pessoal, enfrentando seus medos de perder seu legado e encarando as consequências de suas ações. Apesar da busca pela imortalidade e do medo de morrer, o Gato de Botas percebe que não pode viver de forma imprudente e deixa de aproveitar a vida. Através da desconstrução de sua autoimagem, ele enxerga que a verdadeira força está em sua capacidade de superar o medo e lutar pela vida, encontrando valor na simplicidade e otimismo.

O protagonista aprende que todos podem sentir medo, mas é a capacidade de enfrentá-lo e superá-lo que nos torna verdadeiramente corajosos. Ao perceber que a vida tem valor precioso, o Gato de Botas deixa de lado seu medo de perder seu legado e passa a valorizar a simplicidade e o otimismo, encontrando paz e realização em sua jornada de evolução pessoal.

Matéria – Deivid D’Paula