Publicado em 12/12/2019
Estamos cada vez mais conectados. A era digital chegou, rompeu barreiras físicas, trouxe inúmeras facilidades para a aquisição de produtos e serviços e facilitou as relações sociais. Mas será que ela trouxe apenas vantagens?
Quanto às relações sociais, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman diz que, ao contrário de estabelecermos laços, estamos todos meramente conectados. Uma conexão é muito mais fácil de se fazer e de se desconectar do que construir um laço e, dolorosamente, desfazê-lo. Os botões de “bloquear”, “excluir”, “desfazer amizade” e “deixar de seguir” estão logo ali, ao alcance dos dedos.
O senso de coletividade e a solidariedade vêm sendo substituídos pelo individualismo, a sociabilidade pela civilidade (tolerância cívica) e as relações sociais – que antes se davam pela proximidade – substituídas pelas conexões, que são feitas dentro de casa (ou em qualquer lugar) com um dispositivo móvel em mãos.
Em setembro deste ano, a revista Superinteressante publicou uma matéria sobre a explosão da solidão nos últimos tempos. Nela, os redatores Bruno Gottardi, Ricardo Lacerda e a repórter Fernanda La Cruz informam aos leitores que a crescente solidão observada no século XXI é questão de saúde pública.
Você deve estar se perguntando o porquê, afinal, ficar sozinho é algo normal e cada vez mais comum. Entretanto, se sentir solitário se equipara a fumar 15 cigarros por dia, acarretando diversos problemas de saúde. A sensação de solidão influencia na liberação de cortisol (o hormônio do estresse) que, por sua vez, desequilibra o sistema imunológico ao aumentar a quantidade de neutrófilos no sangue.
Além disso, a solidão pode alterar o hipocampo – região do cérebro responsável por armazenar e gerenciar memórias –, aumentando as chances de desenvolver Alzheimer, além de poder causar alterações epigenéticas, influenciando as emoções das próximas gerações.
Sentir-se só é uma sensação que gera desconforto e dor emocional. As dores são alertas, no corpo, de que algo não vai bem. No cérebro, as dores emocionais são percebidas pela mesma área responsável por captar as dores físicas: o giro do cíngulo anterior, como explica o neurocientista Pedro Calabrez.
Nas redes sociais, é possível observar inúmeras publicações que fazem ode à solidão e de supervalorização do tempo que passamos em nossa própria companhia. Claro que é algo saudável, pois promove o autoconhecimento e proporciona descanso mental, mas não esqueçamos: a solidão mata. E nós, seres biologicamente sociais, o que estamos fazendo diante de uma sociedade cada vez mais individualista e hiperconectada?
A Monteiro diante deste cenário
Malu Có e Emilly Victória, alunas da 2ª série do Ensino Médio da Monteiro, alegam não se sentirem muito sozinhas, pois não conseguem perceber a sensação de solidão, mesmo quando passam muito tempo sós. Frequentemente, elas interagem com outras pessoas por meio de seus smartphones ou se ocupam com alguma tarefa. Este é um cenário que está se tornando cada vez mais comum e que caracteriza um quadro de naturalização da solidão. E, por não conseguirmos perceber nossa própria necessidade de companhia de outras pessoas, podemos ultrapassar os níveis normais de solidão, potencializando-a – o que é preocupante.
Quando perguntadas se já observaram algum colega muito sozinho ou isolado, as alunas disseram que sim, inclusive no ambiente escolar. Ambas alegaram que, quando observam casos como esse, oferecem suas companhias: “Eu procuro conversar e ver se a pessoa está precisando de alguma coisa, como ela está, e, assim, tentar ajudar”, relatou Malu.
Sobre a solidão e os relacionamentos humanos, o professor Marcio Vaccari diz: “Desde que me lembro, a ideia de satisfação na solidão sempre foi vendida na mesma medida que a ideia de felicidade coletiva. A intensificação do discurso do mérito, da autossuficiência, do ‘vim, vi e venci’ é tão disseminada quanto a crença, como diz o poeta, de que ‘é impossível ser feliz sozinho’. O fato é que, nos últimos anos, a tecnologia forneceu instrumentos mais eficazes para alimentar a solidão do que para fomentar o coletivo”.
Vaccari afirma que a Monteiro sempre estimulou atividades colaborativas e o senso de coletividade – mais do que o espírito de competitividade entre os alunos. “Aqui, propagamos a ideia de que professores não são o centro das atenções, mas fomentamos a produção e a circulação do conhecimento, horizontalizando as relações. Isso é fundamental no ambiente escolar, pois não há sentimento colaborativo em relações demasiadamente hierarquizadas”, destaca.
A Monteiro, além de promover a inclusão do diferente, implementa iniciativas que demonstram o incentivo ao respeito e que reforçam o senso de coletividade, como o Projeto Bem-Estar. “Por meio de assembleias entre a comunidade escolar, medidas como esta (o Projeto) aproximam os indivíduos. Podemos, também, mencionar a própria ‘geografia’ da Escola: a Monteiro, por ser uma instituição de médio porte, facilita a manutenção de um nível de entrosamento que perpassa toda a comunidade escolar, que, dessa maneira, favorece a manutenção de um ambiente saudável e propício à aproximação entre as pessoas bem como a produção e disseminação cultural”, explica o professor.
Então, como a Monteiro se posiciona diante de toda essa situação? Vaccari responde, evidenciando a coletividade como um dos maiores valores da Escola: “Acreditamos que o conhecimento é produzido e disseminado por meio da partilha de experiências e do respeito mútuo”.
Talita Vieira.